quarta-feira, 24 de junho de 2009

Inventei que era Luísa

Certa noite, eu estava sentado ao lado do meu avô, que lia ao jornal do dia no sofá.
-Vovô, como você soube que realmente amava vovó?
Ele olhou surpreso pra mim como se estivesse sí perguntando daonde aquilo havia saído.
-Eu nunca soube! Ele respondeu para o meu espanto.
-Mas...mas...se o senhor que é casado com ela há tanto tempo e não sabe, acho que o amor não existe, na verdade! Respondi frustrado.
Vovô calou-se pensativo por alguns segundos, depois continuou.
-Houve uma vez quando eu era menino e voltava do colégio. Eu ia em direção ao metro em São José quando a vi. Não, não era sua avó, era outra mulher. Ela tinha uma beleza, que de tanta ia deixando sobras no caminho, e tudo que ia ficando para trás se tornava belo... as ruas, a calçada, as casas com suas portas e janelas e até mesmo os transeuntes distraídos eram contagiados pela beleza dela. Sua pele tinha aquela mesma essência pura e pecaminosa das maçãs. Ao passar, perguntou-me as horas. Sua voz voz era um ressoar de passarinhos, rouxinóis pela manhã. Por azar, eu havia me esquecido do relógio naquele dia. Pedi desculpas e disse que não tinha horas. Ela agradeceu e sorriu, depois foi embora. Como eu nunca soube seu nome, inventei que era Luísa. Nos dias seguintes, no entanto, não me esqueci de usar o relógio um dia sequer, precavendo-me para um eventual reencontro, mas nunca mais vi Luísa. Porém, todos os dias quando coloco meu relógio pela manhã, recordo-me de Luísa, lembro-me que o amor existiu algum dia e andou por aí, perto de mim, nas ruas.